Os projetos na gaveta de Rodrigo Pacheco
Pautas prioritárias para o governo federal empacam no Senado e ficam sem perspectiva de votação em ano eleitoral
No dia da votação final da Proposta de Emenda à Constituição dos Precatórios, em 15 de dezembro de 2021, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), deu um recado com endereço certo: “É uma maneira de dizer ao Senado que a Câmara, quando assume compromissos, ela cumpre com a maior tranquilidade, sem alarde e com discussão. A oposição continua votando contra, mas a base continua maior”. Uma alfinetada direta à Casa vizinha, o Senado Federal, que nos últimos anos trava projetos e arquiva todos os pedidos de impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Em dois anos, o responsável por ampliar a gaveta de arquivos é Rodrigo Pacheco (PSD-MG). De todos os projetos em tramitação no Senado, Oeste analisou as propostas consideradas pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) como prioritárias para 2022. No Senado, os passos para a aprovação dessas matérias são vagarosos.
De um total de 45 propostas, 11 tramitam no Senado. Até o momento, o única aprovada na Casa é a que reduz a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços dos combustíveis.
Projetos passam de cinco anos sem votação
Na área de segurança pública, um dos projetos mais antigos no Senado é o que propõe a redução da maioridade penal para 16 anos em caso de crimes hediondos, como homicídio doloso. Aprovado em 2015, ainda sob o comando de Eduardo Cunha (MDB-RJ) na Câmara dos Deputados, a proposta está encostada no Senado.
A última movimentação ocorreu em 3 de dezembro de 2019, quando o senador Marcelo Castro (MDB-PI) deixou de ser relator da matéria, por não pertencer mais ao quadro da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
Outra proposta que está parada há dois anos é a que acaba com o auxílio-reclusão. O benefício — hoje no valor de R$ 1,1 mil — é concedido a parentes de pessoas presas que comprovam necessidade. A última movimentação do projeto foi em maio de 2020, também na CCJ. O autor do projeto, senador Márcio Bittar (MDB-AC), defende a ideia de que os gastos com os beneficiários são injustificados. Apenas em 2017, por exemplo, o governo desembolsou pouco mais de R$ 840 milhões com o benefício. “O auxílio-reclusão é um dos elementos de uma concepção profundamente equivocada e paternalista sobre o encarceramento no Brasil. É assistencialismo exacerbado que acaba por gerar consequências não previstas, tais como fraudes e abusos com o dinheiro dos pagadores de impostos”, explica o senador.
Esses e outros projetos considerados prioritários devem ficar para depois das eleições — ou até mesmo para a próxima legislatura. Isso porque a proximidade com o período eleitoral faz com que deputados e senadores evitem pautas polêmicas. Em Brasília, pelos corredores do Congresso, já se fala em “pauta light” a partir da segunda quinzena de junho.
A depender de Pacheco, apenas pautas ligadas ao setor econômico podem entrar em análise no plenário. Quando assumiu o posto de presidente do Senado, Pacheco disse que o foco seriam as reformas, como a tributária e a administrativa. Destas, apenas a modificação na cobrança de impostos é vista como prioritária pelo governo Bolsonaro. No entanto, também não chegou ao plenário do Senado.
Na última semana, os senadores, mais uma vez, ensaiaram uma discussão em torno da Reforma Tributária, mas, por falta de quórum e acordo, a sessão foi encerrada na CCJ. Já a Reforma Administrativa (PEC 32/2020) está na Câmara dos Deputados. Neste caso, Arthur Lira afirmou que falta esforço do governo em torno da proposta.
Pedidos de impeachment arquivados
Não apenas projetos ficam empacados no Senado Federal. Há também uma avalanche de pedidos de impeachment contra ministros do STF. Pela Constituição, esse tipo de processo deve, primeiro, ser analisado pelos senadores, ao contrário de um pedido de impeachment contra o presidente da República, que começa a tramitar pela Câmara dos Deputados.
De acordo com levantamento realizado por Oeste no último dia 31 de maio no sistema do Senado Federal, há 81 pedidos do tipo contra os magistrados. Entre 2008 e 2018, foram 21 pedidos protocolados no Legislativo.
Entre 2019 e 31 de maio de 2022, 60 petições foram registradas contra os ministros do STF. Apenas na gestão de Pacheco, foram 31 pedidos.
O presidente do Senado disse anteriormente que não aceitará os pedidos, porque prefere que todos sentem e conversem. Em agosto do ano passado, Pacheco afirmou que “essa é uma questão paralela. O mais importante é restabelecer o diálogo e a discussão de pontes nacionais.” Procurado por Oeste para falar sobre os motivos que levam o Senado a travar a análise e a votação dos projetos, a assessoria de imprensa de Pacheco não respondeu até o momento.
Deputados, senadores e pessoas sem cargos políticos já pediram impeachment contra ministros do STF — nunca uma votação do tipo ocorreu no país.
Em fevereiro de 2021, o senador Jorge Kajuru (Podemos-GO) apresentou pedido de abertura de processo de impeachment contra Alexandre de Moraes. O senador conseguiu apoio de pouco mais de 3 milhões de pessoas, que assinaram um abaixo-assinado pedindo para Pacheco colocar o pedido para votação no Senado.
À época, Kajuru argumentou que Moraes não poderia decretar a prisão do deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), acusado de ameaçar ministros do STF. Para embasar o pedido, Kajuru ainda usou os inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos. No documento, Kajuru afirmou que o magistrado fez uso do STF para “intimidar, ameaçar e violar os direitos e liberdades individuais de quem se manifestar contra a Corte e seus membros”. O pedido foi arquivado mesmo com apoio popular.
Hoje, o senador não confia na tramitação de uma ação contra ministros do STF. “Lamentavelmente acho que não [vai entrar em tramitação]. Deveria entrar em tramitação para cada senador deixar sua digital, para cada um votar. Por que não, não é?”, afirmou a Oeste.
Historiador aposta em pauta econômica nas eleições
Nos últimos dez anos, o historiador Eduardo Lima analisa os movimentos políticos do Congresso Nacional. Para este ano, ele afirma que os senadores não devem debater pautas como redução da maioridade penal por causa das eleições. “Para que se encaminhem as pautas, depende de debate muito grande, que (os senadores) não estão dispostos a fazer. Muitas precisam de mudança constitucional e essas mudanças não são fáceis”, disse.
Sobre os pedidos de impeachment de ministros, Lima não considera ideal o afastamento de magistrados da Corte. Mas defende rigor nas sabatinas para definir a escolha dos futuros magistrados. “Na realidade, estão tentando consertar a consequência. É preciso atacar a causa, que é dar aval para a escolha do ministro do STF”, afirmou. “O Senado deveria pegar para ele a responsabilidade e fazer direito. Saber se a pessoa está apta a ser ministro. Impeachment faria mal para a República por abrir precedente enorme.”
Por Revista Oeste