Barroso defende que decisão do STF contra jornais não cerceia liberdade de expressão

Barroso defende que decisão do STF contra jornais não cerceia liberdade de expressão

“Não há nenhuma decisão cerceadora da liberdade de expressão. Reafirmamos nosso compromisso com a liberdade de expressão, que, no entanto, não é o único valor que deve prevalecer em uma sociedade civilizada”, disse o ministro

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Roberto Barroso, abordou a recente decisão absurda da Corte que estabeleceu a responsabilidade civil das empresas jornalísticas por declarações proferidas por seus entrevistados. Antes mesmo de dar início à sessão na quinta-feira (30), Barroso destacou que a determinação fortalece a proibição da censura prévia aos veículos de comunicação, enfatizando que o STF desempenha o papel de “guardião” da liberdade de imprensa.

“Ontem (29) reiteramos a vedação expressa de qualquer tipo de censura prévia à imprensa. Portanto, reiteramos a nossa jurisprudência e, em seguida, assentamos que, como regra geral, um veículo de comunicação não responde por declaração de entrevistado, salvo se tiver atuado com dolo, ma-fé ou grave negligência, que evidentemente é critério de responsabilização em toda a parte do mundo”, declarou.

Na data da aprovação da medida, o ministro já havia classificado o caso analisado pelo STF como “excepcional”, instando a uma “interpretação precisa” da decisão. Suas declarações foram feitas durante uma interação com jornalistas durante a exposição “Cartoons contra a Violência”, realizada na sede do STF, em Brasília.

“Não há nenhuma decisão cerceadora da liberdade de expressão. Reafirmamos nosso compromisso com a liberdade de expressão, que, no entanto, não é o único valor que deve prevalecer em uma sociedade civilizada”, disse o ministro.

“Quanto à retirada de notícia, antigamente os jornais de um dia embrulhavam o peixe do dia seguinte. Portanto, deixavam de ser uma fonte de informação falsa. Mas hoje em dia e informação pode permanecer perenemente na internet […] Portanto, se alguém tiver sido falsamente acusado de ter sido condenado por pedofilia, se não for possível remover, aquela notícia ficará para todo o sempre uma informação falsa que pode comprometer a vida daquela pessoa em todas as suas atividades, inclusive na sua vida pessoal”.

O caso que levou o tema ao Supremo envolve uma disputa entre o jornal Diário de Pernambuco e a família do ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho, falecido em 2017. O jornal foi condenado a pagar indenização pela publicação de uma entrevista em 1995 na qual o entrevistado imputou ao ex-parlamentar uma conduta ilícita. Zarattini foi acusado de ser responsável pelo atentado a bomba no aeroporto de Guararapes, em 1968, auge da Ditadura Militar.

Diz o entendimento proposto por Moraes que “a plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas”.

Com uma votação de 9 a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento que definiu as normas para responsabilizar jornais por declarações de injúria, calúnia e difamação feitas durante entrevistas. A tese fixada pelo STF, apresentada abaixo, recebeu críticas de entidades jornalísticas, que alertaram para o potencial de “autocensura” gerado pela decisão.

O presidente da Corte, Barroso, assegurou que a determinação não compromete a liberdade de expressão. Além disso, ele endossou a proposta do ministro Cristiano Zanin, que permite a remoção de conteúdos “comprovadamente injuriosos”, argumentando que essa medida se adapta à era do jornalismo digital e evita a circulação de notícias difamatórias na internet.

Íntegra da fala de Barroso:

“Já havia noticiado internamente e os setoristas já sabem. Nós temos divulgado ao final de todos os julgamentos presenciais uma informação à sociedade em linguagem bastante simples explicando as decisões que são tomadas pelo Supremo Tribunal Federal.

Ainda assim, por muitas vezes, há algum grau de incompreensão em relação ao que o Supremo decidiu, tanto que eu gostaria de prestar um breve esclarecimento. Nós todos do Supremo Tribunal Federal consideramos que a imprensa profissional é um dos alicerces da democracia e a imprensa tem, aqui no Supremo, um dos seus principais guardiões.

Nós temos dezenas de reclamações acolhidas para assegurar a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão. Foi o Supremo Tribunal Federal que declarou inconstitucional por incompatibilidade sistêmica a lei de imprensa do regime militar, em um voto magistral do ministro Carlos Ayres Britto.

Portanto, nós consideramos que a liberdade de expressão é verdadeiramente essencial para a democracia. E não por outra razão, nós ainda ontem reiteramos a vedação expressa de qualquer tipo de censura prévia à imprensa. Portanto, nós reiteramos a nossa jurisprudência e, em seguida, assentamos que, como regra geral, um veículo de comunicação não responde por declaração prestada por entrevistado salvo se tiver atuado com dolo, má-fé ou grave negligência, que, evidentemente,  é critério de responsabilização em toda a parte do mundo.

Portanto, não há nenhuma decisão cerceadora da liberdade de expressão, nós reafirmamos o nosso compromisso com a liberdade de expressão, que, no entanto, não é o único valor que deve prevalecer em uma sociedade civilizada e, portanto, não existindo censura em qualquer hipótese, toda e qualquer pessoa, inclusive pessoa jurídica, pode ser responsabilizada por comportamento doloso, por má-fé ou por grave negligência.

Quanto à questão da retirada de notícia: antigamente, os jornais de um dia, embrulhavam o peixe do dia seguinte e, portanto, ele deixava de ser uma fonte de informação falsa. Porém, hoje em dia, a informação pode permanecer perenemente na internet, como lembrou o ministro Cristiano Zanin, ao propor este acréscimo. E, portanto, se alguém tiver sido falsamente acusado de ter sido condenado por pedofilia, se não for possível remover aquela notícia, ficará para todo sempre uma informação falsa e que pode comprometer para a vida daquela pessoa em todas as suas atividades, inclusive na sua vida pessoal, na sua relação com a sua família.

Portanto, a única possibilidade de indenização, porque não era um caso criminal, era uma indenização de R$ 50.000, é, na hipótese, de alguém ser falsamente acusado de terrorismo e de homicídio e de ter colocado uma bomba em um aeroporto, quando a imputação era falsa, sabidamente falsa, e não se fez o registro. E, portanto, e quem conhece a história, esse homem passou a vida inteira enfrentando a notícia falsa de que havia praticado um ato terrorista. O mal que isso faz para a sua mulher, para os seus filhos, para a sua família. Ali, houve uma entrevista maliciosa e uma negligência em informar que aquele homem investigado não havia sequer sido denunciado pela prática do crime e, ainda assim, se difundiu a informação de que ele teria sido um terrorista, praticado um atentado, matado uma pessoa no aeroporto.

Portanto, em nome do Supremo Tribunal Federal, de todos os colegas cujo pensamento conheço, porque convivemos aqui, nós reiteramos a nossa crença na importância da liberdade de expressão. Reiteramos a vedação à censura e à não-responsabilização de veículo por declaração de terceiro, salvo comportamento doloso, que é a intenção de causar mal a alguém, ou grossa negligência.

Portanto, gostaria de prestar este esclarecimento de que a imprensa continua tendo no Supremo Tribunal Federal um parceiro e, na democracia brasileira, que nós conseguimos fazer prevalecer em meio a muitos ataques, penso que o Supremo, a sociedade civil e a imprensa tiveram um papel decisivo e, portanto, nós confiamos e apoiamos a imprensa profissional agora e sempre.”

Por BSM

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